breviedades pausadas

breviedades pausadas
entre o verde o vermelho

segunda-feira, novembro 27, 2006

uoba!

e ela é algo.
é tudo.
vida nova à ela.
longa, tb.
sempre perto.
bons tempos atuais.
a paz tem se aproximado à passos largos.
aprochegue-se.
ando saudosa de ti.
LUZ PAZ E AMOR

segunda-feira, novembro 13, 2006

no mar de águas


naquela manhã em que abri os olhos tive a sugestão de não vê-lo mais.
pensei, porque não, toda dor é mais ligeira quando corremos e não olhamos para trás.
ouvi a porta estalar, você embaixo d'água num ritual cotidiano de erguer-se novo antes de sair.
a barba que me roçava as entranhas, o cheiro que impregnava a minha pele, os cabelos eriçados, tão seus. resquícios agora no ralo, direto, já que se aprumava ali um novo homem.
o perfume -fecho os olhos e sinto atravessando as frestas a essência, adoro seu cheiro misturado com gotas silvestres; me inebria.
fico estática na cama. debaixo dos lençóis comprados a medida de casal. agora éramos um, ou duas partes.
ouço toda a sinfonia que faz no banheiro, dia após dia.
abre a porta, na cama apóia a toalha, a roupa separada ao corpo nu.
todas as noites eu escolho a camisa de botões, a calça de linho
e dou o nó na gravata. uma supertição nossa, a combinação de cores.
gentilmente você agradece, beija-me a boca com hálito fresco, sorri.
desço as escadas. você alguns passos a frente.
os sons instrumentais da copa misturam-se a ópera do gato.
você arruma a mesa e eu corto o pão.
café, laranjas, mamão. bolos, queijos. leite.
escova os dentes, sorri, se alimenta, se calça, não necessariamente nessa ordem.
mas sempre sai. atravessa a porta ao carro. liga-o, acena e some.
fecho a porta e não sou mais ninguém.
sou um alguém sem função em si. acompanho as horas que se arrastam.
você me consumiu demais, eu quis ser outra parte sua, um braço.
uma muleta. talvez um guarda-chuva.
e eu aqui nesse mar de águas, afogando-me, debatendo-me, esquecida.
o gato se roça na minha perna, sobe logo atrás de mim, as escadas.
deita-se comigo no leito-caixão aonde vejo padecer qualquer coisa, eu.
jaz um qualquer coisa de mim pelos cantos da casa, alagada de mágoas.
os risos que se prendem nas molduras nossas, paralisados no tempo.
do banheiro ainda exala o seu cheiro, respiro profundo consumindo todo o ar.
você é o ar em si, absoluto.
expiro. o animal me ignorando se lambe, banho matinal.
e eu me enrolo ainda mais, pensando em fugir, correr sem olhar para trás.
fecho os olhos e me vejo, sentada num café anos atrás.
uma fulgaz felicidade ímpar nos olhos, e você refletido neles.
o "sim" repetido diversas vezes, eufórico como as pernas, as mãos.
abro-os, já molhada. a água chegou a linha da cama.
ela sobe lenta e contínua. sinto-a na face, sobe acariciando as bochechas.
entra pela boca, pulmão, nariz.
o corpo num reflexo animal me cospe da banheira.
expectoro a água. retorno a cama, úmida. sozinha, fracassada.
ouço a campanhia, desço trôpega, fito a fechadura que roda só.
você, sim você, eu, qualquer função, êxito.
deito em posição fetal e você me envolve. volto a primeira noite que te vi.
sussurra, ainda há tempo de mudar.

quarta-feira, novembro 08, 2006

um contra, outro a favor

no resquício de luz que se permite.
entre os dedos entreabertos por onde escapa.
nos lábios cerrados do calado atônito.
pelos olhos aflitos do interlocutor assoberbado.

as calçadas da rua emolduradas.
nós entre molduras, fora delas ou em qualquer movimento, por um passo.
a distância que se aninha no hall de mágoas, chega à sala, despida.
tinha cheiro por lá. odor nosso, daquele amor sublocado.
pensávamos, eterno, intenso já fora demais.

um dia na rua só, faltava-me o guarda-chuva ou faltava-me você.
o desapego é isso, desconcentração do valor real do outro, enquanto bem querer.
sempre muito mimada. sempre a bater os pés e chorar copiosamente à ter atenção.
o estranho é que nunca lhe faltei. você em pedestal de pedra. fincada no meu peito.
disse árido?

abri a porta e te vi sentada, fitando a janela de persianas entreabertas.
como nossa mascote deu-me um instante de atenção e voltou.
entrei, despi-me, lavei-me, vesti-me, comi e já angustiado fiz menção de lhe tocar.
mas aonde você teria ido depois?
os lábios frios me tocaram parcelado, o olho esquerdo perdido no meu direito, molhado.
mansa me ofereceu os braços, maternais, sorriu e andou pro quarto.
descalça, porque deixou os chinelos?

eu não posso. bati na porta inúmeras vezes, mentalmente. uma, na verdade.
espero e anseio por vê-la. não vem.
a orelha fita a respiração apertada atrás da porta. chora contida, triste demais por lágrimas.
sufoco-me. a essa altura a sala já está abarrotada e você não aguenta mais.
desci as escadas, precisava de alguma adrenalina correndo em mim, anestésica.

foram horas de palavras cuspidas, ressentidas, antigas e desnecessárias.
foram horas de silêncio absoluto, de olhos inchados e mãos recusadas.
foi uma eternidade, triste, intensa, inesquecível.
foi o fim de tudo o que já tinha acabado em nós em silêncio, asfixiado.

corri até nossa antiga casa e percebi que há muito tempo perdera seu cheiro.
você estava nas cartas, nas fotos, na mascote, em silêncio.
e então eu sofri como alguém que tentou demais não se envolver em vão
e perdeu o chão, a chance de ser um pouco mais do que só um.

decidi fechar as persianas e no chão da sala deitar.
a cama era sua, as chinelas fui eu que te dei.